Este artigo é um pedido do Leonardo Cavallieri. Não sei se é exatamente esse Pas de Deux, pois no Lago dos Cisnes tem um também.
Às vezes uma simples progressão harmônica serve como uma ideia para começar a compor, o difícil é criar algo interessante e que soe bem com ela.
Neste artigo vou analisar a peça Pas de Deux do Quebra Nozes de Tchaikovsky e mostrar como uma simples harmonia vira algo grandioso quando bem orquestrado.
A partitura você pode baixar aqui http://imslp.org/wiki/The_Nutcracker_(ballet),_Op.71_(Tchaikovsky,_Pyotr)
E ouvir aqui
Quando se fala de tonalismo logo vem na minha cabeça a palavra clichê, pois não existe uma progressão harmônica dentro do sistema tonal que não foi usada. Não se preocupe, isso não é o fim do mundo! Estamos falando de centenas de anos ouvindo o acorde de V resolvendo no I, ligue o rádio e comprove.
A harmonia, pelo menos pra mim, sempre foi secundária, mas não podemos deixá-la de lado. Mas o que devo fazer? O que sempre fazemos, copiar os grandes mestres.
Tchaikovsky começa com o maior clichê de todos os tempos da última semana, a progressão I VI II V I. Além de ser um bom melodista, ele era muito bom orquestrador, e isso faz toda a diferença.
Essa progressão harmônica é orquestrada de uma maneira bem simples, duas harpas e o naipe das cordas.
Provavelmente você está se perguntando, por que duas harpas? Imagina essa progressão sem a harpa que está fazendo o arpejo.
Esquisito, não acha? Sem o arpejo falta algo, falta movimento e é esse o papel do arpejo, dar movimento para o acorde. Experimenta tocar esse acorde em bloco, não vai soar a mesma coisa. A segunda harpa também toca o acorde arpejado, mas é tão rápido que seu efeito é mais parecido com o naipe das cordas. O papel dessa harpa é deixar o acorde soar, note que as notas do acorde são as mesmas do naipe das cordas.

Mas por que Tchaikovsky não colocou as cordas em arco, sabendo que o som das cordas tem mais volume e mais presença?
Bom, aí deveríamos perguntar para o próprio, mas como ele não está vivo, vamos colocar as cartas na mesa e pensar um pouco.
1. O naipe das cordas tem muito mais instrumentos, com isso temos mais volume e mais peso;
2. O som da harpa é muito mais delicado, e só temos dois harpistas;
3. O som do staccato é completamente diferente de um pizzicato.
Se Tchaikovsky tivesse colocado o som prolongado nas cordas, a segunda harpa perderia todo seu efeito.
Acho que sem a segunda harpa soa melhor, soa mais leve.
Outro ponto para analisarmos é a dinâmica, por que as cordas estão na mesma dinâmica que a harpa?
Sabendo que o naipe das cordas tem muito mais volume, colocar um staccato iria deixar o som um pouco agressivo (meu ponto de vista). A sonoridade do pizzicato é perfeita para essa situação e ainda pode ficar na mesma dinâmica por ter um som mais baixo naturalmente.
Analisar obras dos grandes mestres é o maior aprendizado e o maior tratado de orquestração que nós temos. Com três compassos analisados aprendemos como fazer uma distribuição harmônica, trabalho de dinâmica e como instrumentar uma simples progressão harmônica.
Na distribuição harmônica vimos que um único acorde pode ser orquestrado em vários instrumentos e manter o equilíbrio entre os timbres (dinâmica). A articulação é nossa aliada, visto que um simples pizzicato pode mudar toda a sonoridade do acorde, ou seja, muda completamente a orquestração. Infelizmente isso não se aprende em livros de orquestração, se aprende analisando música, ouvindo música.
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Até a próxima!
Obrigado meu amigo. Era essa mesmo.
Abs