Afinal de contas, fazer um arranjo não é só definir forma, timbre, técnicas e etc?
A resposta é simplesmente não.
Um arranjo não pode ser baseado apenas em técnica, tem que entender o conceito e a estética do estilo proposto. A técnica entra como um complemento.
Conceito
De acordo com o dicionário Michaelis, a palavra conceito significa uma representação mental das características gerais de um objeto. Podemos dizer que o conceito no arranjo é representado pela característica do estilo.
Mas o que o conceito vai ajudar a gente na hora de criar um arranjo?
Vou pegar o tema de Lullaby de Brahms como exemplo.
A partitura do tema.

Lullaby significa canção de ninar. Uma canção de ninar tem essa sonoridade suave, calma e serena.
O arranjador pode pensar em fazer algo parecido com o original, ou seja, mantendo a sonoridade calma, ou o arranjador pode fazer algo completamente diferente, aí entra a estética.
Estética
Quando a palavra estética aparece já nos remete algo filosófico, não é? E, de fato, temos que ter nosso lado pensador, pois como eu disse anteriormente, um bom arranjo não é feito só na base da técnica.
Estética envolve a beleza, mas essa é relativa. Entretanto, devemos nos perguntar o motivo de um arranjo chamar a nossa atenção, aí sim, devemos parar e analisar o que está sendo feito.
Eu vou separar dois itens que eu considero essenciais para uma boa estética: o groove e a harmonia.
Cada estilo tem um ritmo específico, uma fórmula de compasso específica, até mesmo uma harmonia específica, mas cabe ao arranjador explorar novos caminhos. Sendo assim, como será que ficaria o Lullaby do Brahms no estilo bossa nova?
O Groove
O groove é a essência, a identidade do estilo. Uma bossa nova, por exemplo, tem seu ritmo derivado do samba.
O compasso tradicional da bossa é binário, mas o Lullaby é ternário. Como fazer?
Minha dica é que você comece pela bateria. Definindo o groove fica mais fácil.
Um groove de bossa nova não tem mistério, mas é bom saber o conceito para entender o processo. Sendo derivado do samba, e o samba não possui uma bateria, mas vários instrumentos de percussão, temos que adaptar esses instrumentos para a bateria.
O primeiro instrumento, e acredito que é o que chama mais atenção, é tamborim.

O ganzá ou chocalho geralmente preenche os espaços do tamborim tocando em semicolcheia (dependendo da fórmula do compasso e andamento). Suas acentuações são livres, podendo ou não reforçar a linha do tamborim (que também vai variando o ritmo).

O surdo marca sempre o segundo tempo.

A bateria também é um instrumento de percussão. É um conjunto de percussão, na verdade. Sendo assim, fica bem mais fácil de passar esses instrumentos do samba para a bateria. O aro da caixa toca a parte do tamborim, o chimbal toca a parte do ganzá e o bumbo fica com o surdo.

O próximo passo é escrever a melodia que está em 3/4 para 2/4. A maneira mais simples de fazer isso é tocar a melodia junto com o groove. Isso ajuda a entrar no clima.

Harmonia
A bossa nova possui uma harmonia com total influência do jazz. Ou seja, o conceito harmônico é baseado em tétrades. A tríade, além de fugir do conceito, não irá funcionar esteticamente.


Conclusão
Como eu sempre digo, na música não existe certo e o errado, mas o mal feito. O mal feito é exatamente a falta do conceito.
A partir de hoje, comece a pensar mais um pouco sobre conceito e estética na hora de fazer tudo. Seja improvisação, arranjo, composição, mixagem e etc. Não tenha pressa, faça as coisas com tempo. O arranjador não tem que ser rápido, mas não pode ser preguiçoso, jamais.
Ouça o tema completo no estilo bossa nova!
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Até a próxima
Muito bom ! Até eu entendo professor !
Vc usou os sons do Finale pra fazer os exemplos sonoros, o Garritan?
Paulo, obrigado pelo comentário. Eu não usei os sons do finale. No caso, eu fiz direto no cubase, pois o violão e guitarra são gravados. Os demais instrumentos são virtuais.
Abração
Excelente! O arranjo ficou ótimo 🙂
Valeu, Thiago!!
Show de bola, Mestre! Aula de arranjo de ontem mastigadinha com um exemplo foda! Parabéns
Valeu, Pedrinho!!!